quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

A mensagem



Há tempos, dei por mim a ter muito cuidado com o que escrevo nos novíssimos meios de comunicação que vou tendo à disposição. É terrível se pensarmos bem, pelo menos para mim é, senão vejamos, de repente e ao mesmo tempo estou a falar no face, enquanto falo no skype e no gmail e ainda envio e-mails, falo pelo telemóvel e se for preciso até pelo telefone fixo, e há mais que agora não me ocorre mas não me admirava que o caso se passasse de divisão para divisão de uma qualquer casa particular ou mesmo de gabinete para gabinete num escritório qualquer do mundo inteiro. Sim, porque esta suposta ligação feita em vários canais ao mesmo tempo pode muito bem ser local, numa terreola qualquer do Alentejo profundo ou de Grândola para a China. Ora, se for local, imaginemos que sou eu por exemplo, assim não aponto o dedo a ninguém mas toda a gente percebe, sou capaz de estar a comunicar com várias pessoas ao mesmo tempo por canais diferentes. Uma loucura! Faz-me lembrar aqueles empregados da Bolsa que por vezes vejo nas notícias da televisão sobre mercados financeiros e que estão ali sentados nas secretárias a olhar para aqueles ecrãs com numerozitos que eu só lá ia de óculos por serem tantos e tão pequeninos. Parecem uns robots ali quietos de olhar aparentemente pasmado. E no entanto estão concentradíssimos com os cérebros a mil à hora, e se não for a mil arranjam maneira com substâncias ilícitas e menos ilícitas, enfim, consta.


Pois foi por causa de uma mensagem enviada por telemóvel, quando podia perfeitamente ter telefonado, ou mesmo feito uma ligação ao vivo e a cores., mas não, foi simplesmente uma pequena mensagem. E estava bem escrita e tudo. Era precisa e objectiva na questão que colocava. Foi escrita num ápice. Terá sido escrita com um determinado propósito pelo emissor, digamos. E no entanto o receptor  daí o emissor, quando recebe a mensagem compreende-a de outra maneira, limitando-se exclusivamente a ler uma mensagem, um conjunto de letras com um determinado significado, não conseguindo visualizar a atitude física, a expressão facial, a respiração, o tique, a velocidade de entoação daquilo que se diz, e por aí fora de um conjunto de elementos que sem o invólucro  a pessoa que diz, é simplesmente uma mensagem tal como o são as mensagens que os ecrãs de computados dos tais homens robots da bolsa olham horas a fio. Não deve ser fácil, talvez uma questão de hábito, mas passar horas de vida naquele tipo de ambiente, naquele tipo de registo mental entre pessoa e máquina é bem capaz de produzir resultados no mínimo surpreendentes. Daí as mensagens que se recebem poderem ter interpretações genuinamente diferentes. Faltará certamente o resto da mensagem que ficou na origem pois ainda não nos podemos tele-transportar. Acho…

Se por um lado almejamos a globalização, talvez porque a união faz a força, ou sabe-se lá qual o ímpeto que nos faz humanos andar para a frente sempre por caminhos que fazem com que a história da humanidade não tenha qualquer lógica aparente que não seja a inerente ao próprio caos que não deixa de ter a sua lógica, daí a teoria. Por outro lado incomoda-nos o facto de nos sentirmos cada vez mais sós neste mundo globalizado. Esta coisa de andarmos em contacto todos uns com os outros por meios cada vez mais extraordinários e nisso as comunicações são bem capazes de ser o cerne da revolução que estamos a atravessar coloca-nos num estado de letargia que nos vai adormecendo lentamente. Começamos a fazer as nossas próprias interpretações do que lemos, observamos, ouvimos e esquecemo-nos de algo fundamental – o contacto físico. Olhos nos olhos, como se costuma dizer, ao invés de uma mensagem traduzida em letrinhas minúsculas num aparelho de recepção  Por vezes uma mensagem mal interpretada tem consequências que podem inclusive mudar a face da terra como a conhecemos. Tal como a borboleta no Japão pode ser a origem de um tsunami na América, uma mensagem mal interpretada pode ter sabe-se lá que consequências. É preciso aprender a interpretar mensagens. Cada vez mais.

Ou então o melhor é à portuguesa que à sexta-feira por exemplo se resolvem tantos e tantos negócios ao almoço num restaurante, com a barriga cheia e ali, olhos nos olhos. Para negócios não há cá mensagens, para negócios o melhor é ali, frente a frente, não nos vá escapar um pequeno tique antes de uma resposta comprometedora. É preciso sentir, cheirar, observar o emissor de modo a decifrar o todo da mensagem recebida. Há quem lhe chame corrupção mas de facto não o é. É sim uma maneira de estar na vida e bem simples em que nada fica gravado mas existe um compromisso, uma acordo de cavalheiros, uma palavra dada, um toque no ombro, uma oferta ou delicadeza… e pronto. Já no resto, naquelas miudezas que são o sal da vida é giro enviar e receber mensagens só que às vezes corre mal, é curioso.

Beijinhos.